As águas que brotam do Cerrado

As águas que brotam do Cerrado

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O Bioma Cerrado, que de forma mais adequada é denominado Sistema Biogeográfico do Cerrado e que ocupa desde a aurora do Cenozóico a parte central da América do Sul, recebe também o nome “berço das águas” ou “cumeeira” do continente, porque é distribuidor das águas que alimentam as grandes bacias hidrográficas sulamericanas.

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 Por Altair Sales Barbosa


Isto ocorre, porque na área de abrangência do Cerrado, encontram-se três grandes aquíferos, responsáveis pela formação e alimentação de grandes rios continentais. Um desses e mais conhecido é o Aquífero Guarani, associado ao arenito Botucatu e a outras formações areníticas mais antigas. Este aquífero é responsável pelas águas que alimentam a bacia hidrográfica do Paraná, além de abastecer alguns formadores que vertem para a bacia Amazônica. Os outros dois, são os Aquíferos Bambuí e Urucuia.

O primeiro está associado às formações geológicas do Grupo Bambuí e o segundo, está associado à Formação arenítica Urucuia, que em muitos locais aparece sobreposta à Formação Bambuí e em certos pontos, é possível verificar até o contato entre os dois aquíferos, apesar de existir entre ambos, uma imensa diferença cronológica.

Os Aquíferos Bambuí e Urucuia são responsáveis pela formação e alimentação dos rios que integram a bacia do São Francisco e as sub-bacias hidrográficas do Tocantins, Araguaia, além de outras tantas, situadas na abrangência do Cerrado. Esses três grandes Aquíferos, armazenados nos lençóis artesianos, se intercalam na parte central dos chapadões do continente sulamericano, formando lagoas e olhos d’água, conhecidos como águas emendadas, que tomam a direção norte, sul, leste e oeste do continente. Esta direção está condicionada à estrutura geomorfológica que caracteriza cada espaço.


Definindo e delimitando dessa forma as bacias e sub-bacias hidrográficas. Dos planaltos do centro da América do Sul, brotam águas responsáveis pela grande alimentação do rio Amazonas, pela sua margem direita. Das entranhas dos arenitos de idades Mesozóicas, brota a grande maioria das águas da imponente bacia do Paraná, que verte para o sul do continente. Do alto da Serra da Canastra, juntando águas oriundas do arenito da Formação Urucuia e águas retidas nas galerias do 1 Doutor em Antropologia pela Smithsonian Institution – Washington – DC. 2 calcáreo Bambuí de idade Proterozóica, correm em direção ao nordeste do Brasil, as águas do São Francisco.


Além dessas imponentes bacias hidrográficas de dimensões continentais, no cerrado ainda brotam águas que dão origem às bacias hidrográficas independentes de grande importância regional. Algumas são tão fenomenais que formam acidentes únicos. É o caso da bacia do Parnaíba que nasce na Chapada das Mangabeiras, alimentada com águas oriundas do arenito Urucuia, situado no cerrado do Jalapão, Estado do Tocantins.

A bacia do rio Parnaíba, apesar das dimensões serem bem menores que as anteriores, está associada a um grande transporte de sedimentos, que são distribuídos por vasta área do litoral norte do Brasil. Esses sedimentos relacionados às oscilações das marés e aos ventos alísios, formam dunas, lagoas, os Lençóis Maranhenses, os Lençóis Piauienses, e se estendem até Jericoacoara no Ceará.


No encontro com o oceano Atlântico, forma o Delta do Parnaíba, tão complexo e ao mesmo tempo impressionante, que está entre os maiores do Planeta. Outro exemplo importante refere-se à sub-bacia do rio Gurgéia, situada no Cerrado Piauiense, responsável pela irrigação de uma vasta área e pela formação dos poços jorrantes. Águas que afloram com tanta pressão que atingem vários metros de altura.

Os afluentes do amazonas

A Bacia Amazônica é considerada a maior rede hidrográfica da Terra, para descrevê-la um observador, mesmo do espaço seria incapaz de avaliar sua complexidade em meio a ilhas, furos, paranás e igarapés. A bacia hidrográfica do Amazonas tem sua gênese a partir de três importantes regimes. Águas de origem glacial, provenientes dos Andes, águas de origem pluvial que alimentam a bacia pela margem esquerda e nas áreas da nascente e águas tanto de origem pluvial como de lençóis profundos, que o alimentam pela margem direita.


Na realidade, são estes rios da margem direita que contribuem com os maiores volumes de água na alimentação do Amazonas, como também são os responsáveis pela sua regularidade e pela sua perenização, já que as águas pluviais e glaciares, apesar de volumosas, possuem regimes irregulares. Tomando a orientação de leste para oeste, um observador pode constatar quão extensos e volumosos são os afluentes da margem direita do rio Amazonas, que brotam no coração do cerrado e cujas vertentes, qual artérias interligadas, são bombeadas para irrigar e oxigenar o pai dos rios. 3 Tocantins ou Araguaia As sub-bacias do Tocantins e Araguaia são tão complexas e extensas, que não se tem certeza de quem chega ao Amazonas ao sul de Marajó.


Oficialmente é o Tocantins, mas é este que deságua no Araguaia e não o inverso. Porém a nomenclatura e a geomorfologia, pouco importam no momento. O importante a se ressaltar é a quantidade de água e sedimentos que estes rios levam até a foz do Amazonas, transformando esta num ecossistema extremamente complexo. Quem é o Tocantins (um rio de vários nomes) O rio Tocantins bem poderia ser chamado rio Uru, que nasce nos contrafortes da Serra Dourada e resolveu tomar rumo norte, enquanto que seus irmãos de nascentes tomaram rumo oeste em direção ao Araguaia ou rumo sul em direção ao Paranaíba. Entre as pedras o Uru é Uruíta, no caminho dialogou com dona Ana e se formou Uruana, após tanto se encorpar tornou-se Uruaçu ou Uru-grande nos vocábulos do Tupi. Ou o Tocantins seria o rio das Almas, proveniente dos Pirineus, ou Maranhão, ou ainda o Paranã, que vem do longínquo lugar onde as águas se emendam? O fato é que o rio Tocantins é todos eles e muito mais. Inúmeros afluentes caudalosos o alimentam pela margem direita e pela margem esquerda.


Os da margem direita, alguns tem suas nascentes emendadas com águas que correm em direção à bacia do São Francisco e até a bacia do Paraná, como é o caso das águas provenientes do Jalapão e as que nascem no município de Formosa, em Goiás. O mesmo fenômeno acontece com os seus afluentes da margem esquerda, em relação aos da margem direita do Araguaia. São as reentrâncias do interflúvio formado pela Serra do Estrondo, que os separam. Rio Araguaia O rio Araguaia nasce em formações rochosas pertencentes à bacia geológica do Paraná, mas integra a bacia hidrográfica do Amazonas. Seu berço e seu curso superior é composto por águas retidas no Aquífero Guarani.


No nascedouro deste rio, este aquífero se encontra nas Formações Baurú e Botucatu. No mesmo local nascem os rios Taquari e Aporé. O primeiro corre no sentido oeste, integrando a sub-bacia do 4 rio Paraguai no Pantanal Mato-grossense. O segundo corre para sudeste, desaguando no Paranaíba, formador do Paraná. O Araguaia segue sereno para o norte, recebendo a todo instante portentosos afluentes pela margem direita e pela margem esquerda. Alguns desses afluentes são tão extensos e complexos, que delimitam no tempo e no espaço, histórias próprias, como o rio das Mortes, cuja nascente brota das reentrâncias da Serra do Roncador, a pouca distancia, onde ao sul nascem os rios do Pantanal Norte, sub-bacia do Paraguai.


No seu curso intermediário o Araguaia abraça a Ilha do Bananal, a maior ilha fluvial do mundo. Na realidade trata-se de um grande território com rios próprios, lagos, e uma diversidade impressionante. Em meio a esta complexidade, segue o Araguaia, até encontrar o Tocantins ou vice-versa, como já foi dito. Os Outros Caudalosos Afluentes do Amazonas Nas proximidades da nascente do rio das Mortes, jorram das reentrâncias da Serra do Roncador os grandes formadores do Xingu.


No local, também se situam as nascentes do caudaloso Teles Pires. Na borda oeste dessa Serra, surgem as águas do rio Arinos, que se unem com as do Juruena. Este, formado por uma complexa rede de nascentes originarias da borda norte da Chapada dos Parecis, cuja cobertura vegetal, se caracteriza pela presença do cerrado. Teles Pires, Arinos e Juruena se juntam para formar o Tapajós, que deságua no Amazonas na cidade de Santarém. Guaporé, Mamoré e Madeira, têm suas nascentes situadas nos limites oeste do Cerrado, desde a depressão relativa do Pantanal Matogrossense, até as águas provenientes das ilhas de cerrado, situadas nos longínquos planaltos de Alta Lídia, Serra dos Pakaás-Novos, de onde descambam águas do Jamarí que vão engrossar o já grandioso Ji-Paraná, que deságua no Madeira.


São Francisco brasileiro


Toda a bacia hidrográfica do rio São Francisco corre por terras do território brasileiro. O São Francisco tem sua nascente situada em áreas de cerrado, na Serra da Canastra, estado de Minas Gerais. É alimentado especialmente pelas águas acumuladas no Aquífero Urucuia e no Aquífero Bambuí. Seu regime é marcado por diferenciações básicas.

A grande totalidade dos afluentes da margem direita que recebe suas águas principalmente das chuvas, sofre influência direta de climas semiáridos, conduzidos até o curso médio superior do grande vale, pelos eixos de expansão de semi-aridez. Estes rios são classificados como temporários, pois desaparecem na estação seca. Portanto, a perenização do São Francisco está na dependência direta dos afluentes que o alimentam pela margem esquerda. Estes rios volumosos e outrora 5 cristalinos correm encaixados e paralelos na Formação Geológica Urucuia.


A grande maioria provém dos contrafortes leste da Serra Geral ou Espigão Mestre, onde tem origem os rios Carinhanha, Pratudinho, Pratudão, Formoso, Arrojado, Correntina, do Meio, Guará, Santo Antonio, Corrente e Grande. Outros rios que alimentam o São Francisco na porção superior do seu curso têm suas nascentes nas águas emendadas próximas ao Distrito Federal, como é o caso dos rios Preto e Urucuia. Este dá nome à formação geológica que abriga o Aquífero Urucuia, responsável por quase oitenta por cento das águas do São Francisco.


O rio Paracatu é o responsável pela junção das águas dos Aquíferos Bambuí e Urucuia. Um dos poucos rios perenes pela margem direita, é o rio das Velhas que alimenta o curso superior do grande rio, com águas oriundas quase que em sua totalidade do Aquífero Bambuí. A última grande nascente ao norte se constitui no nascedouro do rio Preto, afluente do rio Grande. As nascentes do rio Preto estão em áreas aflorantes do arenito Urucuia, na região do Jalapão, um pouco ao sul da nascente do rio Parnaíba, que constitui bacia própria e é quase água emendada com o rio do Sono, afluente do Tocantins.


Águas do Paraná


A bacia hidrográfica do Paraná é outra que é formada e alimentada pelas águas do Cerrado. Apenas na porção inferior, após receber o rio Uruguai é que este fenômeno não é tão evidente. As águas nascentes da bacia do Paraná se espalham como um leque a partir do coração do Cerrado, correndo em direção ao sul do continente. Das escarpas sul da Chapada dos Parecis, e das escarpas sul e oeste da Serra do Roncador fluem as águas formadoras da sub-bacia do Paraguai, que integra a bacia do Paraná O próprio rio Paraná é formado pela junção dos rios Paranaíba e Grande.


As águas iniciais do Paranaíba são originárias das águas emendadas que viajam desde o norte do Distrito Federal, a estas se juntam as que vertem da Serra das Divisões do centro-sul de Goiás e as que vêm das bordas leste e sul da Serra do Caiapó. As águas do rio Grande se precipitam da borda oeste da Serra da Mantiqueira, numa área de Mata Atlântica, mas seu curso maior percorre de leste a oeste o Estado de Minas Gerais e são as águas do cerrado mineiro que lhes dão corpo. Assim, representada na forma de uma complexa teia, as águas que brotam do Cerrado são as responsáveis pela alimentação e configuração das grandes bacias hidrográficas da América do Sul.


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