Onças-pretas dominam parque no Cerrado e desafiam pesquisadores sobre mutação de onça-pintada

Onças-pretas dominam parque no Cerrado e desafiam pesquisadores sobre mutação de onça-pintada

Onça-preta e onça-pintada são da mesma espécie (Panthera onca) | Foto: nix6658/Creative Commons


Segundo pesquisadores, as panteras negras compõem cerca de 9% da população total de onças-pintadas na região; assista um vídeo do estudo


A região do Cerrado, onde os estados de Minas Gerais, Goiás e Bahia se entrelaçam, guarda um segredo natural fascinante. Onças-pretas, animais raríssimos e enigmáticos, dominam essa paisagem de maneira surpreendente, desafiando a compreensão dos ecologistas e cientistas. Comumente conhecidas como “fantasmas” devido à sua raridade, essas onças-pretas representam uma proporção significativamente maior da população do que se pensava até agora, especialmente no Parque Nacional Grande Sertão Veredas, em Minas Gerais, próximo da divisa com Goiás. O nome da reserva ambiental presta homenagem à obra-prima de Guimarães Rosa.


Embora sejam onças-pretas, também conhecidas como melânicas por causa da alta concentração de pigmento melanina, compõem cerca de 9% da população total de onças-pintadas (Panthera onca), na região do parque e arredores da Pousada Trijunção, sua A proporção é impressionante, representando entre 40% e 48% da população da espécie.


Essa descoberta surpreendente é resultado do esforço incansável do biólogo e coordenador científico da ONG Onçafari, Eduardo Fragoso, que liderou um projeto conjunto com a Trijunção e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Com câmeras escondidas e radiocolares com GPS, Fragoso e sua equipe obtiveram dados valiosos sobre as magníficas panteras negras.


Distinguir as onças-pretas é uma tarefa complexa, já que sua pigmentação torna as rosetas ou “pintas” nas peles quase invisíveis durante o dia. No entanto, à noite, essas rosetas se destacam no espectro infravermelho, o que permite que os pesquisadores identifiquem esses animais. A mutação genética é responsável pela coloração escura dessas onças e é dominante, o que teoricamente não deveria torná-las tão raras.


Adaptações e mistérios

A explicação para a raridade das onças-pretas na região do Cerrado reside em sua adaptação a ambientes abertos. A cor escura aumenta o estresse térmico nesses locais, enquanto sua visibilidade para as presas e eficiência na caça diminui. No entanto, na paisagem característica do sertão de Guimarães Rosa, essas ondas desafiam as expectativas. Um macho batizado de Guirigó, por exemplo, opta por áreas abertas, diferentemente do personagem homônimo de “Grande Sertão Veredas”.


Importância da conservação

Onças-pretas também foram avistadas em outras partes do Cerrado, como Pirenópolis e Chapada dos Veadeiros, em Goiás, e no Jalapão, no Tocantins. A presença dessas onças em unidades de conservação, como o Parque Nacional das Cavernas do Peruaçu, o Refúgio da Vida Silvestre das Veredas do Oeste Baiano e a Reserva do Desenvolvimento Sustentável Veredas do Acari, oferece esperança para sua preservação.

No entanto, as onças-pretas enfrentam ameaças constantes, incluindo a caça ilegal. A impunidade e a sofisticação dos caçadores representam desafios significativos. Portanto, sua sobrevivência depende cada vez mais da proteção em áreas de conservação, conforme enfatizam os pesquisadores. Para esses animais raros, “viver é muito perigoso”, como nos lembra Guimarães Rosa.


Parentesco surpreendente


Análises genéticas comprovaram que onça-preta e onça-pintada são representantes da espécie (Panthera onca). Isso pode parecer estranho quando falamos de animais selvagens, mas pense na nossa variação de cor de pele. O IBGE nos classifica em negros, brancos, pardos, amarelos ou indígenas e, independente de nossa cor, somos todos seres-humanos e pertencemos à mesma espécie (Homo sapiens).


No caso das onças, a coloração escura é causada por uma mutação genética que aumenta a quantidade de melanina, uma das proteínas responsáveis ​​pela pigmentação da pele e dos pelos. Por isso, animais pretos são chamados de melânicos. Essa característica não é exclusiva da Panthera onca, os leopardos melânicos são os mais conhecidos pelo público e são chamados de panteras negras, nome que também é utilizado para se referir às onças-pretas.


Descobertas científicas reveladoras

Onça-preta Guirigó no meio da vegetação do Cerrado | Foto: Eduardo Fragoso/O Globo
Onça-preta Guirigó no meio da vegetação do Cerrado | Foto: Eduardo Fragoso/O Globo


Um estudo publicado no periódico científico PLOS ONE afirma que o melanismo já foi documentado em 13 espécies de felinos diferentes e análises moleculares iniciais revelaram que uma característica surgiu várias vezes na família. Isso significa que mutações diferentes em espécies diferentes levaram ao aparecimento de indivíduos negros.


No caso da onça-pintada, o melanismo é uma característica dominante. Em geral, características dominantes são encontradas na maior parte da população. Ou seja, quando uma onça-preta cruza com uma onça-pintada, existe uma probabilidade maior de nascerem filhotes pretos. No entanto, onças melânicas são raras e aparecem em uma frequência muito menor do que indivíduos amarelos na natureza.


O artigo “Análise da distribuição espacial do melanismo na família felidae em função de condicionantes ambientais” examinou 794 amostras de onças-pintadas provenientes de coleções científicas, armadilhas fotográficas, capturas e DNA fecal, coletas a maior parte da distribuição geográfica da espécie e encontradas uma frequência de 9% de onças-pretas. Os registros ocorreram em regiões da Amazônia, Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica.


Fatores ambientais em Jogo


Curiosamente a variação não foi encontrada no Pantanal. O sistema biogeográfico possui uma das populações mais científicas e benéficas de onça-pintada com alta abundância de indivíduos e habitats razoavelmente bem preservados. Fatores como umidade, temperatura, variações e, principalmente, a radiação solar são determinantes para a ocorrência de indivíduos melânicos. Ou seja, é uma ação de seleção natural que desfavorece a presença da onça-preta na maior parte do Brasil. A mesma conclusão pode ser encontrada no livro “Panthera onca – à sombra das florestas”.


A verdade é que sabemos muito pouco sobre a onça-preta, e mais estudos são necessários para entender melhor esse felino extraordinário.


Assista o vídeo:




Fonte: Misteriosas e raras, onças-pretas dominam parque no Cerrado e intrigam pesquisadores

Onça-preta e onça-pintada são animais da mesma espécie


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